Jair Bolsonaro perdeu mais do que poder sobre o orçamento federal com a
aprovação, pela Câmara dos Deputados, de uma Proposta de Emenda Constitucional
em duas rápidas e acachapantes votações nesta terça (26). Perdeu também parte
do respeito que tinha junto a uma parte dos deputados federais e,
muito provavelmente, dos senadores.
Com 448 votos a favor, no primeiro turno,
e 453, no segundo, os deputados, em pouco mais de uma hora, tornaram
obrigatório o pagamento de investimentos em obras e emendas de bancadas
estaduais, que hoje podem ser adiadas. Com isso, a margem de manobra do governo
federal no orçamento passará de 7% a 3%. O cumprimento do fatídico Teto dos
Gastos pode virar mingau.
Para efeito de comparação: aprovar a abertura de um
processo de impeachment de um presidente da República demanda 342 votos de
deputados federais. O de Dilma Rousseff recebeu 367.
Claro que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra
coisa. Mas a vida dela azedou com pautas-bomba, um comandante da
Câmara descontente com o Planalto e a falta de apoio político no Congresso.
Razão sempre se cria, como em 2016. A questão principal é que, ao
perder apoio político dos parlamentares, um presidente dança.
A decisão sobre o orçamento contou com o voto de
alguns deputados do PSL, entre eles, Eduardo Bolsonaro – que lembrou que ele e
o pai eram favoráveis à matéria anos atrás e que, portanto, isso não seria uma
derrota. Claro! Tanto que o ministro da Economia, Paulo Guedes, que propõe o
contrário, a desvinculação do Orçamento da União, deve estar sorrindo de orelha
a orelha. Ele iria à Comissão de Constituição e Justiça falar sobre a Reforma
da Previdência, nesta terça, mas cancelou.
Cansados de serem criticados pelo presidente via redes
sociais e em entrevistas para veículos de comunicação, nos quais Bolsonaro
repete incessantemente que não se curvará ao tomaladacá da "velha
política" no Congresso Nacional, os deputados do centrão foram à
forra junto com os partidos de oposição – que segue sentada no banco do
passageiro. E, claro, o presidente da Câmara, pois jabuti não sobe em
árvore sozinho.
Bolsonaro passa seus dias na Presidência da República
mais interessado em denunciar golden showers, cartilhas que ensinam
adolescentes a fazer higiene das partes íntimas e importação de bananas do
Equador, mas também em agradar Donald Trump, Olavo de Carvalho e a memória de
golpistas de 1964. Acha que deve continuar agindo assim para ser o
antissistêmico que a ala radical de seus seguidores elegeu, pois
assim terá apoio para permanecer no cargo.
Não se deu conta que sua incapacidade política, a
falta de vontade em construir uma relação com o Congresso Nacional e a
arrogância que isso transmite, vai minando o (pouco) respeito que têm
junto aos parlamentares. Respeito que não é oriundo das relações que construiu
em quase três décadas de baixo clero, mas da legitimidade dos votos que
recebeu nas eleições de outubro. Com sua aprovação em queda, conforme a
última pesquisa Ibope, deputados percebem que o respaldo popular está sumindo
muito antes da hora.
E, como um tubarão, deram uma mordida para
ver o que acontecia.
Se Bolsonaro continuar se mostrando um presidente
ausente do ponto de vista da articulação, que depende do suporte dado pela
ala militar de seu governo e da mobilização constante nas redes sociais de seus
seguidores mais fiéis, o Congresso vai tomar gosto pela coisa. Após terem
percebido que a Presidência também sangra, um dos deputados cujo partido
apoia a reforma conversou com blog. Brincou com a possibilidade
de implementar um parlamentarismo mambembe, em que as grandes
decisões ficariam com eles e Bolsonaro seria reduzido a chefe de Estado e
YouTuber.
Claro que isso é exagero de deputado empolgado, o
presidente pode retomar sua dignidade se quiser. A questão é se ele
percebe a gravidade do que aconteceu. E, percebendo, se realmente se importa.
E, se importando, se é capaz de reagir.
FONTE: Blog do Sakamoto
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